Encoprese: a incontinência fecal que afeta crianças e famílias

A encoprese é a incontinência fecal em crianças com mais de 4 anos. Pode parecer estranho falar disso, mas acontece com mais frequência do que as pessoas imaginam. E quase sempre vem acompanhado de vergonha — tanto para a criança quanto para os pais.

O problema é real e afeta a vida social e emocional de quem passa por isso. Mas dá para lidar com ele, desde que a gente entenda o que está acontecendo.

O que é, afinal?

Tecnicamente, encoprese é a eliminação de fezes em locais inadequados por crianças depois dos 4 anos, quando não há um problema físico direto que explique (von Gontard et al., IACAPAP Textbook of Child and Adolescent Mental Health). Ou seja: a criança não consegue controlar as fezes, e os “acidentes” viram rotina.

Importante deixar claro: encoprese não é preguiça, sujeira ou desobediência. Tem a ver com o funcionamento do corpo e do comportamento da criança. Precisa de ajuda profissional, não de bronca.

Os Tipos de Encoprese

Existem dois tipos principais, e saber qual é qual ajuda no tratamento:

Encoprese com Constipação

É a forma mais comum. Acontece assim:

  • A criança faz cocô poucas vezes
  • Fezes muito duras, grandes ou esquisitas
  • Dor na hora de fazer
  • Dor de barriga frequente
  • Falta de fome
  • O médico consegue sentir fezes acumuladas na barriga (von Gontard, 2013)

O que acontece é o seguinte: a criança tem constipação, as fezes acumulam. E aí vaza.

Encoprese Sem Constipação

Menos comum, mas acontece:

  • Cocô normal, todos os dias
  • Menos dor
  • Come normalmente
  • Não tem fezes acumuladas

A criança tem controle fisiológico, mas o comportamento não acompanha.

As Causas

Não dá para apontar uma causa só. Na maioria das vezes, é uma mistura de coisas.

Questões físicas e genéticas

Genética pesa. Crianças que têm histórico familiar de problemas intestinais têm mais chances de ter encoprese. E a constipação pode começar por qualquer coisa: mudanças na dieta, desidratação ou situações de estresse como mudança de escola, separação dos pais. Quando isso vira crônico, a encoprese pode aparecer.

O lado emocional

Ansiedade, estresse familiar, traumas ou pressão durante o desfralde podem piorar tudo. Estudos mostram que 30-50% das crianças com encoprese têm ansiedade, TDAH ou transtorno opositor (von Gontard et al., IACAPAP Textbook of Child and Adolescent Mental Health).

Como o problema se alimenta

O pior é que a encoprese vira um ciclo. A criança tem constipação, sente dor, e passa a evitar defecar. Isso piora a constipação, até que vaza. Se acontece na frente dos outros, a vergonha aumenta. A ansiedade piora. E volta tudo de novo.

Os Sinais

Preste atenção nestes pontos:

  • Acidentes regulares, depois dos 4-5 anos
  • Cheiro de cocô persistente
  • Recusar usar o banheiro ou isolar
  • Dor de barriga frequente
  • Tristeza
  • Evitar atividades com amigos

Como se Diagnostica

O médico vai investigar várias coisas:

  1. Histórico completo dos hábitos intestinais, história médica, ambiente familiar e situações de estresse.
  2. Ferramentas como a Escala de Bristol para avaliar tipo e consistência do cocô.
  3. Exame Físico do abdômen para detectar acúmulo fecal.
  4. Outros exames quando necessário, para descartar causas médicas sérias.

O Tratamento

Encoprese tem tratamento. Cada caso é diferente, mas algumas coisas ajudam:

Psicoeducação

Explicar a criança e a família o que é encoprese já reduz a culpa e a vergonha.

Treinamento de Banheiro

Criar horários fixos para usar o banheiro, principalmente após as refeições. Sem pressão.

Medicação para Constipação

Quando tem constipação, laxante ajuda muito.

  • Primeiro, limpeza: enemas ou polietilenoglicol (PEG)
  • Depois, manutenção: PEG ou lactulose para manter o cocô macio e regular

Cuidar de outros problemas

Se a criança tem ansiedade, TDAH ou outra coisa, tratar junto ajuda. Às vezes precisa de psicoterapia.

Apoio Familiar e Escolar

Evitar punição, vergonha e culpabilização faz diferença.

Como Evolui

Sem tratamento, pode piorar: isolamento, baixa autoestima, problemas emocionais. Mas com tratamento, a maioria das crianças melhora (von Gontard et al., IACAPAP Textbook of Child and Adolescent Mental Health). O tempo varia, mas persistência e paciência fazem a diferença.

Perguntas para Pensar

  1. Você já parou para pensar em como reage quando a criança tem um “acidente”? Ela percebe sua frustração?
  2. Saber se tem constipação envolvida muda o tratamento. Você sabe identificar?
  3. O que na rotina da casa ou da escola pode estar piorando o problema? Dá para mudar algo?

Referências

GONTARD, A. von et al. Encopresis in Children and Adolescents. In: IONÉSIA ARAÚJO DO AMARAL, A.; DIAS SILVA, F. (Org.). IACAPAP Textbook of Child and Adolescent Mental Health. [s.l.]: International Association for Child and Adolescent Psychiatry and Allied Professions, [s.d.]. Disponível em: iacapap.org. Acesso em: 17 nov. 2025.

Advertência

Este conteúdo é informativo e não substitui um médico. Procure um psiquiatra infantil ou pediatra se precisar de ajuda.